17 abril, 2008

A Revolução Islâmica - Introdução

Em 1979, milhões de populares saíram às ruas em protesto contra o regime monárquico do Shah Reza Pahlavi enquanto clamavam pelo regresso do Ayatollah Khomeini, em manifestações que se estenderam das ruas da capital Teerão até todas as outras cidades e províncias do Irão. Este marco histórico numa evolução de acontecimentos que se alargavam desde 1978, com particular incidência, e desde 1953 numa escalada de dissensões e actos manifestos de oposição ao regime pelas suas políticas interna e externa, provou ser uma reviravolta no modo como o Islão enfrentava um sistema bipolar e de globalização. Desde então, o mundo parece ter vindo a caminhar para uma confirmação da tese de Huntington de 1996 intitulada O Choque de Civilizações, na qual identifica que as grandes linhas de fractura ou de tensão nas relações internacionais de finais do século XX e início do século XXI serão em zonas de clivagens religiosas.

Com efeito, nesta óptica o Islão possui fronteiras bastante conflituosas com os seus vizinhos. No entanto, esta uma evolução que deve muito do seu fulgor religioso e ideológico à Revolução Islâmica de 1979, pois até então o mundo islâmico, especialmente no Médio Oriente, enfrentava sérias dificuldades em acompanhar o progresso económico e tecnológico testemunhado nas restantes regiões do globo, assim como as pressões resultantes da globalização dos mercados mundiais. Numa clara afirmação da especificidade histórica, cultural e religiosa do povo do Profeta e de Allah, o Islão emergiu como um dos principais actores contemporâneos das relações internacionais, atraindo sobre si toda uma hoste de islamólogos, estudiosos, analistas e curiosos que procuram destrinçar a complexa realidade que personalidades como o Shah Pahlavi, Ayatollah Khomeini, Saddam Hussein, Nasser, Yasser Arafat, entre muitos outros, expressam na esfera internacional.

No caso particular do Irão, o enredo da sua revolução desenrola-se entre duas grandes figuras com os seus projectos completamente distintos daquilo que deveria ser a perspectiva da nação iraniana face ao Al-Corão e ao Islão, assim como face ao mundo. O primeiro, modernista e pró-ocidental, visou implementar políticas de ocidentalização numa população esmagadoramente muçulmana tradicionalista e de identidade muito vincada e específica; o segundo pregou um regresso à Shari`a e à teocratização do regime. Ambos alegavam defender os melhores interesses da nação muçulmana iraniana, embora com planos completamente díspares.

De igual forma, os partidários internos e externas de cada figura também eram completamente díspares, partidários esses que participaram activamente no desenrolar de certos acontecimentos chave que agudizaram uma situação já de si precária e volátil. Mas como em todos os regimes pré-revolucionários, a decadência é gradual e um somatório de vários factores interdependentes, mas que em determinadas circunstâncias resultam num súbito levantamento da vontade das massas contra o poder da classe governante. Desde a queda do Primeiro-Ministro Mossadegh num golpe de Estado ensaiado pelos EUA para o derrubar, até à inspiração da Revolução Branca e treino da Savak, a polícia secreta do regime, podemos testemunhar uma contínua promiscuidade entre os principais intervenientes iranianos e as grandes potências internacionais da época.

O trabalho que se segue respeita a ordem de ideias infra:

  • Contextualização da história do Irão até ao século XX, referindo as suas origens no Império Persa, disputa entre os povos Selêucida, macedónio, Árabe, Sassanida, Safávida, e Qadjar até à dinastia Pahlavi;
  • Referência a noções fundamentais do Islão enquanto religião, ideologia, doutrina e movimento social no Irão, desde a sua introdução no século VII d.C. até à Revolução Islâmica, assim como os seus cismas, famílias e fundamentos;
  • Análise elaborada do contributo do regime Qadjar no dealbar do século XX e importância de Reza Khan como antecedente dinástico do regime Pahlavi do Shah, antes da ascensão do seu filho, Reza Pahlavi em 1941;
  • Avaliação dos projectos reformistas e modernizantes introduzidos pelo Shah ao longo da sua dinastia, seu planeamento e execução;
  • Avaliação do movimento reaccionário anti-monárquico desde 1941, ano da ascensão do Shah Reza ao trono, seus principais interlocutores, apoiantes e acções com vista à destituição do mesmo do Trono do Pavão;
  • Inserção internacional do Irão no período da II Guerra Mundial e Guerra-Fria, e relação com os Estados Unidos da América e União das Repúblicas Socialistas Soviéticas enquanto dois pólos estruturantes de um sistema no qual se observou a Revolução de 1979;
  • Estudo da importância do comércio petrolífero para a economia e sociedade iraniana, suas concessões a empresas estrangeiras, nacionalização na década de 50 e subsequente aproveitamento até ao regime teocrático do Ayatollah Khomeini;
  • Análise do período iraniano pós-revolucionário até à actualidade, tomando em linha de conta as consequências e importância da Revolução Islâmica na sucessão desses acontecimentos;

Segundo esta sequência de conteúdos, assim como pela perspectiva adoptada sobre a importância dos mesmos, extrairemos certamente as devidas lições de um fenómeno cuja importância para as relações internacionais não foi ainda devidamente explorada, não só pela riqueza analítica dos eventos e consequências, como, mais importante ainda, a sua contínua sucessão a um ritmo acelerado em matérias de política internacional contemporânea.


  • Prólogo

  • Introdução

  • O Irão da Pérsia aos Safávidas

  • O Islão na Pérsia

  • O Irão dos Safávidas ao Pahlavis

  • O Jogo do Petróleo

  • O Início da Relação Irão-Ocidente

  • O Irão na II Guerra Mundial

  • O Irão na Guerra-Fria

  • O Projecto Reformista do Shah

  • Um Desagrado Crescente

  • As Manifestações de Janeiro, 1978

  • O Incêndio de Abadan

  • A Sexta-feira Negra

  • Os Últimos Dias do Trono do Pavão

  • O Período Pós-Revolucionário

  • Conclusão e Bibliografia
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